Artigo: O PT na oposição

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Por: Carlos Galuban Neto*

Correm na imprensa notícias de que Fernando Haddad entregou o projeto da nova regra fiscal ao presidente Lula. Embora ainda não se conheçam os detalhes da proposta, as perspectivas parecem animadoras: alas do PT lideradas por Gleisi Hoffman e Aloísio Mercadante a teriam desaprovado. O motivo? Seria parecida demais com o teto de gastos atualmente vigente.

Para os de memória curta, o teto de gastos foi eleito, durante a última campanha petista, o grande inimigo do povo brasileiro, o limite do cartão de crédito que impediria governantes benevolentes de beneficiarem a população com as mais variadas benesses.

Para os de memória mais curta ainda, contudo, é necessário lembrar que o teto de gastos teve grande parcela de responsabilidade na reconstrução da reputação da economia brasileira após os equívocos do governo Dilma na área. A melhora foi tanta que, não custa lembrar, Michel Temer assumiu o país com taxas de juros a 14% ao ano e entregou a seu sucessor a Selic a 6,40%.

Infelizmente, o teto terminou o governo Bolsonaro todo esburacado, o que gerou a necessidade de reparos, missão esta confiada a Haddad e sua equipe. O Ministro da Fazenda demonstrou, em excelente entrevista concedida à CNN, ter consciência de que países como o Brasil não podem se dar ao luxo de endividar-se em demasia, sob pena de colherem índices de inflação altíssimos que, ao fim, prejudicam – vejam só – os mais pobres, justamente aqueles que os tais governantes benevolentes juraram proteger.

É natural, aliás, que a proposta apresentada por Haddad seja alvo do fogo amigo petista. Como bem descrito no excelente livro “PT, uma história”, de autoria do cientista político Celso Rocha de Barros, o PT, enquanto único partido de relevância nascido fora do Estado Brasileiro, conviveu, ao longo de sua trajetória, com disputas entre as mais distintas correntes políticas e de pensamento econômico.

No livro, o autor relembra que, nas primeiras administrações petistas nos municípios do país, os prefeitos do partido sofriam ferrenha oposição, não dos partidos rivais, como se poderia imaginar, mas dos movimentos sociais ligados ao PT, que viam com maus olhos a adoção de medidas que, durante a campanha eleitoral, eram “coisa da velha política”. O PT ainda não sabia, mas governar também é ter de fazer aquilo que, nos tempos da campanha eleitoral, acusou-se o adversário de praticar.

A disputa da vez, aparentemente entre grupos capitaneados por Haddad, de um lado, e Gleisi Hoffman e Mercadante, de outro, terá como árbitro justamente Lula. Em seu primeiro mandato, aconteceu duelo parecido, e Palocci, o Ministro da Fazenda da época, conviveu com a artilharia pesada de Dilma Roussef e Guido Mantega.

Embora tenha entregado bons resultados na economia, Palocci, tal qual o jogador que marca o gol do título, mas é expulso por tirar a camisa e, portanto, fica impedido de levantar a taça, foi dragado por escândalos de corrupção e teve de assistir à ascensão de Dilma à presidência e de Mantega ao Ministério da Fazenda.

O tempo irá dizer, mas, se Lula ainda for pragmático como em seu primeiro mandato, evitando que determinadas correntes do PT virem oposição ao governo, Haddad poderá conseguir aquilo que Palocci teve nos dedos e deixou escapar: ser o sucessor de Lula na presidência da República.

*Carlos Galuban Neto é advogado formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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